O Governo angolano vai aprovar um estudo para reparar os danos sofridos pelas vítimas de repressão, pelos défices de governação e por perseguição política, anunciou, em Genebra, o ministro da Justiça e Direitos Humanos, Francisco Queiroz. Em tese serão incluídas as vítimas desse “pequeno incidente” em que foram assassinados pelo MPLA milhares e milhares de angolanos nos massacres do 27 de Maio de 1977.
Segundo o governante, que falava na 125ª sessão ordinária do Comité para os Direitos Humanos das Nações Unidas, o estudo prevê ressarcir as vítimas dos massacres da guerrilha e da guerra, além dos envolvidos na monumental mentira a que o regime do MPLA chama “tentativa de golpe de estado de 27 de Maio de 1977”.
O anúncio deste estudo do Governo surge alguns dias depois de o Presidente da República, João Lourenço, ter determinado, por decreto, a redução, por comutação, para seis meses de prisão, das penas aplicadas a oito cidadãos indiciados por associação criminosa, rebelião e atentado.
Vem, de igual modo, na sequência de uma série de acções que o Chefe de Estado vem promovendo para estender o diálogo com organizações da sociedade civil, que reclamam, há muito, o direito de serem ouvidas e de contribuírem com os seus pontos de vista ou opiniões.
A medida assenta numa estratégia nacional que visa reforçar a capacidade interna, a fim de promover, defender, fiscalizar, corrigir, denunciar e condenar os atropelos aos direitos humanos que fazem parte do ADN do MPLA, mesmo antes da independência de Angola.
De acordo com o ministro da Justiça e dos Direitos Humanos, Francisco Queiroz, Angola vive hoje um novo ciclo político, inaugurado pelo Presidente da República, João Lourenço, que dá garantias de que os direitos humanos assumiram outra dimensão e atenção.
A seu ver, nota-se, no país, um novo impulso nos direitos humanos, políticos e civis. Que o digam, por exemplo, os activistas em Cabinda que, para além de agredidos, foram presos porque, até prova em contrário, são todos culpados daquilo que o MPLA quiser.
O governante lembrou que durante 15 anos de paz (por acaso são 17) o país registou progressos na defesa dos direitos civis e políticos, sobretudo na preservação dos direitos, deveres e garantias fundamentais.
Francisco Queiroz fez saber que após 27 anos de guerra, o Índice de Desenvolvimento Humano passou de 0,486, em 2012, para 0,532 em 2015, reflectindo incremento de 9,486 por cento.
Esta evolução corresponde a uma média anual de crescimento de 3,15 por cento. Em 2018, passou para 0,581. Actualmente Angola é considerado país de Índice de Rendimento Médio.
A esperança de vida à nascença, sustentou Francisco Queiroz, passou de cerca de 44 anos, em 2000, para 60 anos, em 2014, e 61 anos em 2018. Se o MPLA continuar no poder, como pretende, por mais umas dezenas de anos, a esperança de vida deverá chegar (tal é velocidade regeneradora da demagogia) aos… 110 anos!
O quadro legal de promoção e protecção dos Direitos Humanos também conheceu uma evolução considerável, com destaque para a recente aprovação, a 23 de Janeiro deste ano, do novo Código Penal Angolano, disse Francisco Queiroz.
No seu relatório ao Comité para os Direitos Humanos das Nações Unidas, o governante angolano aludiu, ainda, ao acolhimento de estrangeiros em Angola, pelos mais diversos propósitos.
Segundo informou, vivem em Angola 161.345 estrangeiros em situação regular, dos quais 65.777 são refugiados e requerentes de asilo.
Operação Resgate com ou sem direitos humanos
Em Novembro de 2018, o ministro das Relações Exteriores de Angola, Manuel Augusto, esclareceu (diz o Governo) perante as Nações Unidas, em Genebra, as medidas tomadas recentemente “que visam impedir a continuação de práticas que têm lesado profundamente” o país no quadro da “Operação Transparência”, parente chegado da “Operação Resgate”.
Respeitando as superiores ordens do Ministério da Comunicação Social, o Jornal de Angola deu ao assunto o título: «Angola repõe a verdade na ONU sobre a “Operação Transparência”». Mais modesta, a Angop titulava: «Angola esclarece posição em Genebra».
Segundo uma nota do Ministério das Relações Exteriores, Manuel Augusto explicou a situação durante um encontro com a Alta-Comissária das Nações Unidas para os Direitos Humanos, Michelle Bachelet, em que, lê-se no texto oficial, deu a conhecer a versão de Angola sobre a operação, “com vista a repor a verdade”.
Manuel Augusto, acrescenta-se na nota de imprensa, disse a Michelle Bachelet que a verdade “tem sido “adulterada pela difusão de informação relacionada com as alegadas expulsões massivas e forçadas de cidadãos estrangeiros e consequentes violações de direitos humanos dos mesmos”.
“Angola deplora a publicação dessas informações, caracterizadas pela não-observância dos usos e práticas de imparcialidade, isenção e objectividade que devem reger os princípios e normas de procedimentos que exigem que o Estado acusado possa apresentar a sua versão sobre os factos”, refere o documento, citando as palavras ditas pelo chefe da diplomacia angolana à Alta-Comissária.
É visível nesta declaração que o Ministro Manuel Augusto frequentou, certamente com sucesso pleno, o Curso Nacional em Liderança e Gestão de Comunicação para Mudança de Comportamento, no âmbito da reciclagem e actualização do doutoramento em “Educação Patriótica”.
“O ministro passou a mesma mensagem no encontro com o Alto-Comissário das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR), Fillipo Grandi, sediado em Genebra, e esclareceu as duas entidades que a operação visa prevenir eventuais fontes de financiamentos para alimentar e sustentar possíveis grupos armados susceptível de desestabilizarem países da região dos Grandes Lagos”, acrescenta-se na nota.
Mais grave do que os prejuízos económicos resultantes da exploração ilegal dos recursos, prossegue a nota, “são os danos causados à natureza por todo o tipo de escavação e utilização de explosivos, provocando alterações ambientais e efeitos negativos irreparáveis no ecossistema angolano”.
No comunicado é indicado que Angola continuará a colaborar com todas as instituições internacionais, incluindo a Comissão dos Direitos Humanos da ONU e com o ACNUR para o mesmo fim, “tendo sempre presente os princípios do respeito pela soberania e integridade territorial”.
Desde 25 de Setembro que o Governo tem em curso a “Operação Transparência”, de combate à imigração e tráfico ilegal de diamantes, operação que já resultou no repatriamento de mais de 420.000 estrangeiros e a apreensão de mais de um milhão de dólares, 17.000 quilates de diamantes e 51 armas de fogo e o encerramento de centenas de casas de compra e venda de diamantes e de 91 cooperativas.
A 16 de Outubro, as Nações Unidas expressaram preocupação sobre a alegada saída forçada de Angola de, então, cerca de 200.000 cidadãos da vizinha RD Congo, admitindo que a situação pode gerar uma crise humanitária.
A ONU disse que as expulsões em massa são contrárias às obrigações da Carta Africana e exorta os Governos de Angola e da RD Congo, cuja fronteira se estende por cerca de 2.500 quilómetros, a trabalharem juntos para garantirem um “movimento populacional” seguro.
Desde então que as autoridades angolanas têm-se desdobrado em contactos internacionais para explicar que a operação se destina a combater o garimpo ilegal não é dirigida especificamente a congoleses da RD Congo, sublinhando que o objectivo do Governo “é travar a exploração indevida de diamantes”, que está a ser “protagonizada por redes de crime organizado”, que estão a transformar as zonas em causa “num Estado autónomo”.
“Temos regiões onde a população é toda constituída por imigrantes e foi montada uma estrutura, com chefia e guarda armada. É um problema sério de segurança nacional”, observou o governante angolano, acrescentando que o problema mais grave é a destruição ambiental provocada pela acção dos garimpeiros ilegais.
“As organizações não-governamentais, que estão sempre à espera de desgraças em África para poder ganhar dinheiro, começam a criar a imagem de que há uma crise humanitária. Já se começa a dizer que são necessários milhões para atender crianças que estão a ser deportadas massivamente. Mas, o Governo angolano sabe o que está a fazer”, frisou Manuel Augusto a 2 de Novembro, em Maputo.
A maior parte dos congoleses agora expulsos de Angola são uma mistura de imigrantes de longa duração que trabalham no garimpo e de refugiados que deixaram a RD Congo durante o conflito regional que assolou o Kasai entre meados de 2016 e 2017.
Por não ter dado crédito às “ordens superiores”, o Mosaiko – Instituto para Cidadania, organização não-governamental angolana de defesa dos direitos humanos denunciou o “tratamento deplorável” das autoridades angolanas a “imigrantes ilegais” da República Democrática do Congo, incluindo crianças e grávidas, no quadro da “Operação Transparência”.
Numa nota de imprensa, o Mosaiko (que teima em julgar que Angola já é o que não é – um Estado de Direito) manifestou-se “bastante preocupado” com a operação de “combate à imigração e exploração ilegal de diamantes”, iniciada a 25 de Setembro.
De acordo com o Mosaiko, que apelou ao “respeito dos direitos humanos” e às convenções internacionais rubricadas por Angola, a “inquietação” baseia-se em “factos evidenciados” entre os dias 14 e 18 de Outubro no município do Cuango, província angolana da Luanda Norte.
No local, a equipa do Instituto, que procedia a uma monitorização do Relatório de Avaliação Participativa sobre o Acesso a Justiça, constatou que várias pessoas “ficavam entre dois e três dias à espera de transporte, sem o mínimo de condições para passar as noites”.
“Sem alimentos, e muitas delas dormindo no chão, sem agasalhos, as pessoas, inclusive crianças e mulheres gestantes, eram levadas até à fronteira nas carroçarias de camiões em condições deploráveis”, refere o Mosaiko.
Para a instituição angolana de defesa dos direitos humanos, os actos “transgridem o direito à liberdade e à protecção” previstos na Constituição da República de Angola (CRA), bem como “à livre circulação e à escolha de domicílio”, conforme a Lei sobre o Regime Jurídico dos Estrangeiros na República de Angola.
O Mosaiko refere que as crianças, adolescentes e jovens em idade escolar “são obrigados a abandonar os estudos” para acompanhar os progenitores, o que “viola o seu direito à educação”, previsto na Constituição angolana e no artigo 27.º da Declaração Universal dos Direitos Humanos (DUDH).
“O Estado Angolano não só ratificou tratados internacionais, como também acautelou na sua Constituição que todos os preceitos constitucionais e legais relativos aos direitos fundamentais devem ser interpretados e integrados em harmonia com a DUDH, a Carta Africana dos Direitos Humanos e dos Povos e os tratados internacionais”, observou o Mosaiko.
“Cada pessoa, estrangeira ou não, deve ser tratada com dignidade e respeito. A eventual ilegalidade das pessoas não justifica os maus-tratos aos quais têm sido submetidas. Por isso, apelamos ao Governo de Angola, aos órgãos competentes, para que no pleno comprometimento que o Estado Angolano e os órgãos de soberania têm com as pessoas, independentemente de qual seja a situação, cuidem para que os seus direitos sejam respeitados”, conclui a nota assinada pelo director-geral da organização, Júlio Candeeiro.
O Alto-Comissário das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR), Fillipo Grandi… será parente go Grande Ghandi?